XIX Congress of the Iberoamerican Society of Digital Graphics, 

Font Size: 
Reflexões sobre as interfaces entre a modelagem paramétrica e outros processos de representação no projeto de arquitetura.
Neliza Maria e Silva Romcy, Marcelo Bezerra de Melo Tinoco

Last modified: 2015-08-27

Abstract


Introdução:

O caráter essencial da arquitetura está no fato de agir como um vocabulário tridimensional que inclui o homem, trazendo o problema da representação do espaço. Zevi (1996) coloca que, isoladamente ou no seu conjunto, os instrumentos dos quais os projetistas dispõem, como plantas, seções, maquetes, fotografias e cinematografia, são incapazes de representar completamente o espaço arquitetônico. Porém, o autor ressalta a importância de aprofundar o assunto, como missão de estudar as técnicas disponíveis e torna-las mais úteis. Assim, cada um dos meios para representar o espaço pode ser investigado, aprofundado e melhorado, trazendo uma contribuição original e permitindo aos outros preencher as eventuais lacunas.

A lenta, mas constante implementação dos sistemas informáticos gerou certa desconfiança no meio arquitetônico, pois era difícil para um arquiteto entender em que sentido um computador poderia ser útil para o seu trabalho. Mesmo utilizando processos de projeto auxiliado por computador (CAD), seu aproveitamento era extremamente limitado – ao herdar uma ideia de desenho de prancheta e replicar esse processo mediante o computador, o potencial do sistema não era completamente aproveitado (Orciuoli, 2010).

A evolução do projeto digital (digital design) como um campo de conhecimento específico é um fenômeno que vem se cristalizando rapidamente na última década, trazendo impactos crescentes nas práticas de projeto e produção, e sugerindo um re-exame das teorias e metodologias no intuito de guiar pesquisas e desenvolvimentos futuros (Oxman, 2006).

Nesse contexto destaca-se a modelagem paramétrica, que permite representar os objetos, não com geometria e propriedades fixas, mas parâmetros e regras que determinam características geométricas e não geométricas. Os parâmetros e regras podem ser expressões que também se relacionam com outros objetos, permitindo atualização automática, de acordo com o controle do usuário ou mudanças de contexto (Eastman et. al, 2011). A maior alteração do CAD tradicional para a modelagem paramétrica é a possibilidade de interação entre o usuário e o modelo, devido à mudança de uma modelagem baseada na definição de objetos para uma modelagem baseada na definição de características, restrições e variáveis de um objeto, com foco nas relações entre as partes (Florio, 2012).

O presente artigo tem como objetivo investigar quais interfaces podem ser estabelecidas entre a modelagem paramétrica e outros processos de representação, considerando as especificidades de cada um. A investigação sobre essas relações amplia a compreensão sobre a introdução da modelagem paramétrica no processo de projeto e permite uma maior integração junto aos outros meios, estabelecendo contribuições e o preenchimento de lacunas.

Procedimentos metodológicos:

O método utilizado consistiu em pesquisa bibliográfica, no intuito de levantar as especificidades dos processos de representação mais utilizados em projeto arquitetônico, definindo suas potencialidades e limitações. Posteriormente, tais características foram cruzadas com as especificidades da modelagem paramétrica para investigar possíveis interfaces e contribuições recíprocas.

Segundo Kowaltowski et al (2006), recomenda-se que seja aplicada uma combinação de ferramentas, o que permite uma colocação maior de exigências sobre o projeto e o aprofundamento de análise durante o desenvolvimento do produto. Segundo os autores, a concepção que viaja várias vezes do papel para os modelos digitais e físicos deve ser estimulada com aspectos positivos sobre o processo e o produto final.

Assim, para a seleção dos instrumentos de representação, buscou-se incluir processos analógicos e digitais, considerando a bibliografia sobre o tema. Além da modelagem paramétrica, foram investigados: desenho à mão livre, maquete, modelagem de informação da construção (BIM), prototipagem rápida e fabricação digital. Não foram incluídos os processos de projeto auxiliado por computador a partir de desenho vetorial, associados à primeira geração desoftwares aplicáveis à arquitetura e caracterizados como “pranchetas eletrônicas”.

Resultados:

Longe de serem produtos fortuitos, as representações são produtos básicos do processo de pensar, portanto a capacidade de realiza-las e gerenciá-las é uma das principais habilidades ao projetar (Lawson, 2011).

Hudson (2010) define o processo paramétrico de projeto como o desenvolvimento de um modelo ou descrição de um problema, onde a representação é baseada nas relações entre objetos controlados por variáveis (parâmetros). Apesar dos modelos paramétricos serem dinâmicos e de rápida alteração para a investigação de soluções, consistem em estruturas complexas que levam tempo de criação. Como se fundamentam na relação entre objetos, o processo paramétrico de projeto depende da definição dessas relações e da habilidade do projetista durante essa etapa (Woodbury, 2010). Assim, meios de representação de rápida manipulação que contribuam para a compreensão das características essenciais dos objetos e suas possíveis relações são fundamentais durante a (re)estruturação dos modelos paramétricos.

O desenho à mão livre é o meio mais intuitivo para registrar graficamente observações, ideias e experiências, devido à sua natureza tátil e cinestésica. Dentre os tipos de desenho arquitetônico, destacam-se os diagramas por sua capacidade de simplificar uma noção complexa em elementos e relações cruciais, por meio de um processo de eliminação e redução. A natureza abstrata do diagrama permite entender o que há de essencial nos elementos de projeto e suas possíveis relações para gerar diferentes alternativas (Ching, 2011).

A maquete arquitetônica busca representar um nível do projeto, a partir da visualização plástico-espacial da ideia, e pode ser classificada em maquete de idealização, de trabalho ou de execução. Assim como os diagramas, destaca-se a maquete de idealização por sua espontaneidade na estruturação e fácil alterabilidade, trabalhando com meios simples e materiais maleáveis (Wolfgang e Martin, 2003).

No que diz respeito às tecnologias recentes, destacam-se o BIM e os processos de produção com prototipagem e fabricação digitais.

O BIM pode ser definido como a criação e uso de informação computacional coordenada e consistente sobre o projeto de uma edificação – informação paramétrica usada para tomada de decisões em projeto, produção de documentação, previsão de desempenho, estimativa de custo e planejamento de obra (Krygiel e Nies, 2008). A modelagem paramétrica é considerada uma das fundações tecnológicas do BIM (Eastman et. al, 2011), o que permitiu sua diferenciação em relação aos softwares de desenho vetorial. Porém, apesar dos modelos BIM serem orientados a objetos, o ferramental existente ainda é mais voltado para a fase de desenvolvimento de projeto do que para a concepção (Ruschel, 2014). Soluções recentes, como o plug-in Dynamo para Revit (Autodesk) e o add-on entre Rhinoceros (Robert McNell & Associates) e Archicad (Graphisoft), estão sendo desenvolvidas para aproximar sistemas BIM e aplicativos de programação visual. Assim, busca-se a continuidade no fluxo de informação entre a modelagem paramétrica propriamente dita e a modelagem de informação da construção, que se complementam para as etapas de concepção, desenvolvimento e documentação do projeto.

Por fim, os processos de prototipagem e fabricação digitais se referem a métodos que permitem a transição do modelo digital para o físico de maneira automatizada, onde o produto final pode ser uma maquete, um protótipo ou elementos construtivos (Pupo, 2009). Tais processos resgatam a discussão sobre a necessidade de incorporar a produção de modelos físicos como parte do processo de design, para a verificação de soluções construtivas e realização de ajustes. Sua integração junto à modelagem paramétrica permite um processo contínuo entre a produção dos modelos físicos e o retorno na definição dos parâmetros para ajustes projetuais (Nojmoto, Tramontano e Anelli), o que enriquece a investigação de possibilidades e as tomadas de decisão. Soma-se, ainda, que a utilização de processos paramétricos permite a concepção de uma família inteira de componentes relacionados, e não apenas objetos específicos. Com o estabelecimento de uma cadeia de produção integrada a partir da fabricação digital, possibilita-se a geração de elementos diversos, todos provenientes de um mesmo projeto, mas ajustáveis a especificidades da situação (Karzel e Matcha, 2009).

Discussão:

A investigação sobre os diferentes processos de representação em projeto arquitetônico permite o reconhecimento de suas especificidades no que diz respeito a potenciais e limitações. O presente trabalho contribui para a discussão das possíveis interfaces entre a modelagem paramétrica e outros meios de representação, ampliando a compreensão sobre sua introdução no processo de projeto e integração junto aos outros meios.

A modelagem paramétrica se caracteriza por gerar objetos dinâmicos, de informação integrada, e rápida alteração para a investigação de soluções. Porém, são estruturas complexas que levam tempo de criação e podem se tornar de difícil compreensão à medida que agregam mais elementos.

Para a etapa de (re)estruturação dos modelos paramétricos, destaca-se o auxílio de diagramas e maquetes de idealização como meios espontâneos e intuitivos, que buscam ressaltar os principais elementos e relações da proposta.

As interfaces com sistemas BIM permitem um fluxo mais contínuo de informações, a partir da transformação de modelos paramétricos topológicos em objetos de categorias específicas da disciplina de projeto, o que aproxima as etapas de concepção, desenvolvimento e documentação.

Por fim, a integração com os processos de prototipagem e fabricação digitais enriquecem tanto o processo de projeto, a partir da investigação de possibilidades e tomada de decisão, quanto a cadeia de produção de elementos diversos caracterizados pela customização em massa.

Assim, a abordagem paramétrica ressalta a experimentação e a colaboração durante a atividade projetual, ao trabalhar com um modelo convergente e multidimensional de informações interconectadas. A compreensão de suas interfaces com outros processos de representação enriquece o processo de projeto, incluindo aspectos de concepção, desenvolvimento, documentação e materialização.


Keywords


Modelagem paramétrica; Meios de representação; Processo de projeto

References


CHING, F. D. K. Representação Gráfica em Arquitetura. 5ª ed. Porto Alegre: Ed. Bookman, 2011.

EASTMAN, C.; TEICHOLZ, P.; SACKS, R; LISTON, K. BIM Handbook: a Guide to Building Information Modeling for Owners, Managers, Designers, Engineers, and Contractors. Hoboken (NJ): John Wiley & Sons, 2011.

FLORIO, W. Notas sobre pensamento e cognição em projetos paramétricos. In: II Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Natal, 2012.

HUDSON, R. Strategies for Parametric Design in Architecture: An application of practice led research. Thesis (Doctor of Philosophy (PhD)). University of Bath, 2010.

KARZEL, R.; MATCHA, H. Experimental Design-Build: Teaching Parameter-based Design. In: Computation: The New Realm of Architectural Design [27th eCAADe Conference Proceedings]. Istanbul, 2009.

KRYGIEL, E.; NIES, B. Green BIM: successful sustainable design with building information modeling. Wiley Publishing, Inc. Indianapolis, Indiana, 2008. ISBN: 978-0-470-23960-5.

KOWALTOWSKI, D. C. C. K.; CELANI, M. G. C.; MOREIRA, D. C.; PINA, S. A. M.; RUSCHEL, R. C.; SILVA, V. G.; LABAKI, L. C.; PETRECHE, J. R. Reflexão sobre metodologias de projeto arquitetônico. In: Ambiente Construído, v. 6, n. 2, p. 7–19, 2006.

LAWSON, B. Como arquitetos e designers pensam. São Paulo: Oficina de Textos, 2011.

NOJIMOTO, C.; TRAMONTANO, M; ANELLI, R. L. S. Design Paramétrico: Experiência Didática. In: SIGraDi 2011. XV Congreso de La Sociedad Iberoamericana de Grafica Digital. Santa Fé, 2011.

ORCIUOLI, A. Projeto assistido por computador: ontem, hoje, amanhã. In: Revista Arquitetura e Urbanismo. São Paulo: PINI. Ed. 197. Agosto, 2010.

OXMAN, R. Theory and design in the first digital age. Design Studies, v. 27, n. 3, p. 229–265, 2006.

PUPO, R. Inserção da PROTOTIPAGEM e FABRICAÇÃO DIGITAIS no processo de projeto: um novo desafio para o ensino de Arquitetura. Tese (Doutorado) Engenharia Civil – Faculdade de Engenharia Civil, Universidade Estadual de Campinas, 2009.

RUSCHEL, R. C. To BIM or not to BIM? In: III Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, 2014, São Paulo.

WOLFGANG, K.; MARTIN, H. Maquetes arquitetônicas. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

WOODBURY, R. Elements of parametric design. Routledge, 2010.

ZEVI, B. Saber ver a arquitetura.  5ª Edição. São Paulo: Martins Fontes, 1996.


An account with this site is required in order to view papers. Click here to create an account.