XIX Congress of the Iberoamerican Society of Digital Graphics, 

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Workshop para geração de Habitação de Interesse Social: O uso da Gramática da Forma como experiência didática
Leticia Teixeira Mendes, Gabriela Celani

Last modified: 2015-08-27

Abstract


Introdução

Há décadas o Brasil vem tentando solucionar seu problema de déficit de moradias, por meio de uma estratégia modernista de tipologias padronizadas e implantação repetitiva, o que tem resultado, na maioria das vezes, em espaços públicos de baixa qualidade espacial, pouco variados e carentes de uma gradação entre as áreas públicas e privadas que permita a criação de comunidades solidárias dentro dos grandes conjuntos habitacionais. Este artigo tem como objetivo apresentar parte dos resultados de uma pesquisa de doutorado que utilizou o formalismo da gramática da forma e a abordagem da modelagem paramétrica como métodos para a geração de espaços públicos em conjuntos de habitação de interesse social (HIS) no Brasil; assumindo, assim, que essa metodologia pode contribuir para uma exploração mais ampla e aprofundada de diferentes soluções projetuais.

Tipo de abordagem e instrumentos metodológicos

A metodologia proposta para o exercício projetual baseia-se no método da pesquisa- ação, proposto por Kurt Lewin, nos anos 1940 e na prática reflexiva, definida por Schön, em 1983. Segundo Tripp (2005), este método se insere no processo básico de investigação-ação; dentre eles estão a pesquisa-ação (LEWIN, 1946) e a prática reflexiva (SCHÖN, 1983), entre outros. O método desenvolvido por Lewin é principalmente uma estratégia para o desenvolvimento de professores e pesquisadores que se utilizam de suas pesquisas para aprimorar sua didática, e como consequência, o aprendizado de seus alunos. O livro The Reflective Practitioner, de Schön, propõe um questionamento: “que tipo de educação profissional seria adequada para uma epistemologia da prática baseada na reflexão-na-ação?” (SCHÖN, 2000). Assim, este método teve como objetivo propor uma teoria do conhecimento que partisse da competência e do talento já inerentes à prática habilidosa – em um exercício definido como reflexão-na-ação, ou seja, o “pensar o que fazem, enquanto o fazem” (SCHÖN, 1983; SCHÖN, 2000).

O livro “Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem” (SCHÖN, 2000), discute a experimentação nos ateliês de projetos arquitetônicos como um modelo educacional para a reflexão-na-ação, assim, o autor argumenta que não há uma ciência geral que ensine a prática projetual, a não ser nos ateliês de projeto, sendo um exemplo típico de ensino prático reflexivo.

Exercícios de projeto: O uso da Gramática da Forma como método para desenvolvimento de projetos de implantação urbana em conjuntos de HIS

Com o objetivo de testar o método foram organizados três workshops com alunos do curso de Arquitetura e Urbanismo de uma universidade brasileira (omitido para avaliação cega). Cada workshop foi direcionado para diferentes escalas do projeto de um conjunto habitacional: (1) desenho urbano (escala do bairro), (2) implantação urbana do conjunto habitacional e (3) relação entre os edifícios e os espaços externos. Neste artigo serão apresentados os resultados do 2o e 3o workshops, com o intuito de destacar o uso da Gramática da forma como método de projeto e sua implementação em um exercício manual.

A área delimitada para a intervenção proposta está localizada na cidade de Campinas, limítrofe à Rodovia Lix da Cunha e constitui um importante vetor de crescimento da cidade em direção ao aeroporto internacional. O local também suscita diversas questões com as quais os estudantes teriam que se confrontar para o desenvolvimento do projeto, dentre elas a diversidade da vizinhança (que inclui um condomínio de alto padrão, um conjunto habitacional, um loteamento de baixa renda, assentamentos informais e um empreendimento do Governo Federal para treinamento Olímpico), e a proximidade do cruzamento da Rodovia Anhanguera com a Lix da Cunha, onde se encontra o maior assentamento informal de Campinas, o Parque Oziel.

O 2o e 3o workshop foram desenvolvidos no laboratório de prototipagem rápida de uma universidade brasileira e foi constituído por três etapas: Fase teórica, Fase de desenvolvimento (Parte I e Parte II) e Fase prática (Parte I e Parte II).

Fase teórica

A primeira fase objetivou contextualizar o tema da habitação de interesse social no Brasil e apresentar estudos de caso de projetos de conjuntos de HIS, bem como demonstrar a aplicação da Gramática da Forma para a análise e geração de projetos de habitação e implantação urbana, como por exemplo, as gramáticas da Malagueira (DUARTE, 2003; DUARTE, 2007), os estudos de caso do concurso “Habitação para todos”, organizado pelo CDHU/IAB (MENDES e CELANI, 2013), a gramática das Villas de Palladio (STINY e MITCHELL, 1978) e as gramáticas desenvolvidas a partir da análise dos conjuntos habitacionais Belapur, projetado pelo arquiteto Charles Correa e PREVI-Lima, do arquiteto Christopher Alexander.

Esta etapa buscou demonstrar a potencialidade do uso de um sistema para a geração de diferentes soluções de projeto e sua aplicação na questão da implantação de conjuntos de HIS.

Fase de desenvolvimento

A Fase de Desenvolvimento foi composta por 2 etapas: a primeira parte teve como objetivo propor um exercício para que os alunos utilizassem a Gramática da Forma como método de análise para inferir as regras de composição de 2 conjuntos habitacionais. A segunda etapa (Parte II) foi constituída por exercícios para o aprendizado de Gramáticas da Forma tridimensionais, a partir da análise das Gramáticas do conjunto habitacional Jardim São Francisco (ANDRADE et al., 2012) e das Casas da Pradaria (KONING e EIZENBERG, 1981).

Fase Prática

Parte I:

Essa etapa da atividade constituiu no desenvolvimento do exercício de projeto, a partir do conhecimento adquirido sobre o método (Gramática da Forma) e o contexto de HIS no Brasil. Os alunos se dividiram em grupos de dois a quatro pessoas para desenvolverem uma gramática para geração das habitações, blocos habitacionais e implantação urbana do conjunto. Dessa forma, receberam o mesmo material e formas geométricas, para criarem o vocabulário da gramática e as regras de composição.

O material escolhido foi constituído por peças de madeira de diferentes tamanhos e cores, originalmente fabricadas para o ensino infantil de operações matemáticas de frações. Esse material se mostrou bastante adequado, pelo fácil manuseio, possibilidade de experimentação de diferentes soluções (as peças podem ser coladas provisoriamente com fita dupla-face) e permite a definição de escala do modelo de acordo com as regras da gramática, por exemplo: um cubo amarelo pode representar uma unidade habitacional inteira ou apenas um cômodo da casa (de acordo com a escala definida e com o vocabulário da gramática).

Parte II:

A segunda parte da Fase Prática do exercício projetual constituiu uma 2a etapa do workshop descrito anteriormente e teve como objetivo desenvolver um projeto de conjunto de HIS, utilizando-se a Gramática da Forma como método projetual, enfatizando a criação/definição dos seguintes elementos: a) espaços públicos;
b) áreas de lazer, praças, espaços comunitários; c) comércio;
d) sistema de transporte;
e) relação transporte/pedestre;
f) hierarquia das vias;
g) sustentabilidade;
h) densidade de 300 a 400 habitantes/hectares.

O vocabulário de formas foi previamente definido – baseado apenas em cubos de diferentes dimensões nas cores azul e vermelho, pois optou-se por disponibilizar para os alunos uma gramática pré-definida para a geração das unidades habitacionais, para que os resultados do exercício projetual fossem direcionados às questões relacionadas à implantação dos blocos, áreas externas e escala dos espaços públicos (Figura 1).

Resultados

A avaliação dos resultados foi feita por meio de questionários aplicados aos alunos e embasados na opinião de especialistas que participaram em cada etapa do trabalho. Dessa forma, foi possível observar a importância de disponibilizar para os alunos ferramentas que lhes permitam, de uma maneira sistemática e objetiva, alcançar resultados de maior complexidade, variedade, ganho qualitativo e com consciência dos seus objetivos (intencionalidade da aplicação das regras). O uso dos métodos adotados contribuiu para a criação de composições com maior diversidade e qualidade especial.

Discussão

Ao discutir sobre o tema da habitação de interesse social no Brasil e propor um método de projeto para estimular e incentivar a criação de conjuntos habitacionais com implantação mais diversificada, esta pesquisa buscou contribuir com a melhoria do ensino de projeto em cursos de graduação em Arquitetura e Urbanismo. Entretanto, o assunto não foi esgotado. Dentro desse contexto, propõe-se desdobrar o método em outras aplicações, como projetos de escolas, hospitais, entre outros, assim como projetos habitacionais para outros níveis econômicos.

Além disso, os seguintes tópicos poderiam ser incluídos em pesquisas futuras: (1) inserir a variável da topografia nos exercícios projetuais, pois devido à limitação de tempo dos workshops e simplificação das variáveis de projeto, optou-se pela utilização de terrenos planos e um número reduzido de parâmetros. Em futuras implementações do método em disciplina, pretende-se incluir um maior número de variáveis como topografia, sustentabilidade, infra- estrutura urbana, mobilidade, acessibilidade e paisagismo.


Keywords


gramática da forma; habitação de interesse social; metodologia de projeto.

References


ANDRADE, M.; MENDES, L. T.; GODOI, G.; CELANI, G. Shape grammars for analyzing social housing: The case of Jardim São Francisco low-income housing development. In: Education and Research in Computer Aided Architectural Design in Europe - eCAADe, 2012, Praga. Proceedings of eCAADe 2012. Prague: Technical Univ. Prague, 2012. v. 1. p. 451-458.

DUARTE, J. P. Personalizar a habitação em série: Uma Gramática Discursiva para as Casas da Malagueira do Siza. Lisboa: Ed. Fundação Calouste Gulbenkian, 2007.

DUARTE, J. P. A Discursive Grammar for Customizing Mass Housing - The case of Siza ́s houses at Malagueira. Ecaade, 2003. pp.665-675.

KONING, H.; EIZENBERG, J. The language of the prairie: Frank Lloyd Wright‟s prairie houses. In: Environment and Planning B: Planning and Design, v.8, p.295-323, 1981.

LEWIN, K. Action research and minority problems. Journal of Social Issues, n. 2, p. 34-36, 1946.

MENDES, L. T.; CELANI, G. O uso da Gramática da Forma para análise de conjuntos habitacionais de interesse social no Brasil: O concurso “Habitação para Todos”. In: Congresso Internacional de Habitação no Espaço Lusófono CIHEL – LNEC. Proceedings Congresso Internacional de Habitação no Espaço Lusófono 2013, Lisboa, 2013, p. 193-194.

SCHÖN, D. The reflective practitioner: how professionals think in action. Nova York: Basic Books, 1983.

SCHÖN, D. Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Ed. Artmed, 2000.

STINY, G.; GIPS, J. Shape Grammars and the Generative Specification of Painting and Sculpture, in C V Freiman (ed) Proceedings of IFIP Congress 71 (Amsterdam: North-Holland) 1460- 1465. Republished in O R Petrocelli (ed), The Best Computer Papers of 1971 (Philadelphia: Auerbach) pp125-13, 1972.

STINY G, MITCHELL W. J. The Palladian Grammar. In Environment and Planning B: Planning and Design 5, p. 5-18, 1978.

TRIPP, D. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Trad. Lólio Lourenço de Oliveira. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 443-466, set./dez. 2005.


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