Last modified: 2015-08-27
Abstract
INTRODUÇÃO
O artigo aqui proposto apresenta uma reflexão sobre três aspectos do uso de programas computacionais paramétricos no ensino de projeto de arquitetura: 1. a concepção de edificações com geometrias complexas; 2. a produção contínua de modelos físicos como parte indissociável do processo de projeto; 3. a formulação de exercícios procurando explorar as potencialidades dos programas e dos modos de projetar e construir que eles pressupõem. Apóia-se no exame da experiência didática de uma disciplina obrigatória de Projeto de Arquitetura em uma universidade pública do Estado de São Paulo, que vem sendo desenvolvida desde 2011, associada aos estudos e experimentações sobre design paramétrico e fabricação digital de um grupo de pesquisa da mesma instituição. A pesquisa aqui abordada refere-se a um projeto de pesquisa financiado pelo Edital Universal CNPq.
Parece ser crescente o número de cursos de arquitetura brasileiros em que programas computacionais ditos paramétricos são utilizados nas disciplinas de projeto. Mesmo que seu uso assegure uma grande diversidade formal arquitetônica, as chamadas geometrias complexas, com múltiplas curvaturas, ainda são comumente confundidas com o próprio conceito de parametrização em arquitetura. No entanto, se, por um lado, tais programas possibilitam maior rigor de desenho e de produção, associados a técnicas de fabricação digital, permitindo um grande controle dos elementos construtivos até então difícil de se obter, por outro lado pode-se, efetivamente, empregar alguns desses programas para se repensar as formas arquitetônicas, amparando-se nas possibilidades técnicas que parametrização e fabricação digital, juntas, oferecem (DUNN, 2012).
Trata-se de formas e espaços pouco presentes no repertório arquitetônico nacional, ainda que estabeleçam diálogo com diversos exemplos da arquitetura moderna e vernacular brasileira, e, inclusive, mais facilmente do que em outros países onde tais formas têm sido igualmente estudadas e produzidas. É nesse sentido que a produção contínua de maquetes e modelos físicos, durante o processo de projeto, faz grande diferença, permitindo melhor compreender as edificações que estão sendo desenhadas, antecipar questões construtivas e de organização de obra. De fato, existe um correlato claro entre as maneiras de produção dos componentes de modelos, através de corte a laser, impressão 3D e fresadora CNC, e os processos industriais, baseados no uso de máquinas que trabalham de maneira bastante similar a essas, ainda que em outra escala. É, por isso, fundamental que, na produção de seus modelos, cada aluno seja capacitado a manusear pessoalmente essas máquinas, pois isso vai ajudá-lo a construir um entendimento claro sobre a produção de componentes, futuramente, no âmbito da obra.
Finalmente, a essa forma de produção de arquitetura, inteiramente assistida por computadores, devem corresponder exercícios didáticos de projeto cuja formulação proponha um treinamento de novas maneiras de conceber o projeto e de produzir os componentes para sua execução. Dessa forma, os exercícios propostos aos alunos partem de premissas, oferecidas pela parametrização, de adequação local de projetos a partir da manipulação de alguns de seus parâmetros. Em outras palavras, propõe-se que equipamentos públicos conformando redes urbanas possam ser desenhados a partir de um programa governamental único e geral, mas que, a partir de alterações paramétricas, sejam adequados a situações específicas em diferentes partes da cidade, e, ainda assim, tenham seus componentes construtivos produzidos em série, graças aos procedimentos de fabricação digital.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
De duração semestral, a disciplina tem como tema o projeto de uma linha de Veículo Leve sobre Trilhos - VLT, com uma estação em cada uma de suas extremidades e diversos abrigos em sua extensão. Após a definição de traçado, considerando diversas questões urbanas, e o desenho de cada trecho da linha, através de cortes das vias públicas e a localização exata de cada abrigo, as equipes de alunos propõem um projeto para uma estação, usando formas complexas. Esse projeto será, por sua vez, inteiramente detalhado e especificado, no sentido de fornecer um conjunto de soluções técnicas e parâmetros que comporá uma espécie de guia técnico. Em seguida, cada aluno da equipe, individualmente, se apropriará dos princípios do projeto da estação, desenvolvido em equipe e, por alteração dos valores atribuídos aos seus parâmetros, trabalhará no desenho de um dos diversos abrigos da linha. Durante todo o processo, diversas maquetes e modelos são produzidos, através de impressão 3D e corte a laser, a partir dos arquivos gerados nos programas paramétricos, permitindo que os alunos experimentem de diversas maneiras a noção de file-to-factory, segundo procedimentos descritos por Oosterhuis et all. (2004), Kolarevic (2009) e Woodbury (2010). Pesquisadores do grupo de pesquisa participam das sessões de trabalho em atelier, discutindo com as equipes suas escolhas em termos de scripts e maneiras de ler as informações contidas nos modelos geométricos gerados. Os pesquisadores também auxiliam no uso das máquinas de fabricação digital pelos alunos, observando e produzindo registros para avaliação posterior.
RESULTADOS
O artigo aqui proposto apresentará resultados obtidos ao longo desses cinco anos de realização da disciplina, utilizando-os para promover uma reflexão capaz de contribuir para o atual interesse por programas paramétricos e técnicas de fabricação digital na área de Arquitetura e Urbanismo. Foram produzidos, pelos alunos, centenas de maquetes e modelos físicos parciais, inclusive em escala 1:1, além de pranchas com detalhamento construtivo baseado em consulta a especialistas e a fornecedores regionais, contribuindo para o mapeamento da existência de maquinário industrial digital no arranjo produtivo do estado.
Os resultados incluem, também, o estímulo a um comportamento proativo dos alunos na busca de programas computacionais via Internet capazes de auxiliá-los em problemas específicos no processo de concepção e realização. Por essa razão, o uso dos programas Grasshopper e Rhinoceros, incialmente solicitado aos alunos, tem sido espontaneamente acrescido de diversos outros programas, encontrados na Internet de várias formas - em fóruns especializados, em websites técnicos, através de escritórios de arquitetura, com colegas de anos anteriores, etc. - reafirmando novas maneiras de aprendizagem nas quais a informação está disponível em muitas fontes e não apenas, e nem sempre principalmente, no aporte dos professores. A crítica e as implicações de seu uso no que concerne a arquitetura, a cidade e a paisagem, no entanto, dependem estreitamente da reflexão presencial em atelier, com professores e colegas, coletivamente.
DISCUSSÃO
Os três aspectos selecionados para esse breve artigo abrem, inversamente, um leque bastante amplo de questões para debate, dentro da área de Arquitetura e Urbanismo. Essas questões podem ser de várias ordens: ligadas a maneiras emergentes de se entender o ensino de projeto; aos processos de projeto em arquitetura e urbanismo em si, propostos pela combinação design paramétrico-fabricação digital; à proposição de formas geométricas complexas para edificações na paisagem urbana; às relações múltiplas e a serem aprofundadas entre os processos de projeto e a produção digital de modelos e maquetes físicas; e às relações entre produção de modelos e produção de componentes construtivos, entre outros. É fundamental que tais questões sejam continuamente avaliadas por alunos e pesquisadores, e que registros sejam produzidos, capazes de alimentar a reflexão e a prática na atual formação de arquitetos em nosso país.
Keywords
References
DUNN, N. Digital fabrication in Architecture. London: Lawrence King, 2012.
KOLAREVIC, B. Architecture in the digital age: design and manufacturing. New York; London: Taylor & Francis, 2009.
OOSTERHUIS, K.; BIER, H.H.; AALBERS, C.; BOER, S. File to Factory and Real Time Behavior in ONL-Architecture. Proceedings of the 23rd Annual Conference of the ACADIA and the 2004 Conference of the AIA Technology in Architectural Practice Knowledge Community. Cambridge: November 8-14, 2004.
WOODBURY, R. Elements of parametric design. New York: Routledge, 2010.