XIX Congress of the Iberoamerican Society of Digital Graphics, 

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REFORMAR OU NÃO REFORMAR? ANÁLISE DA INFLUÊNCIA DA FORMA NA CUSTOMIZAÇÃO DE PROJETOS DE APARTAMENTOS
CRISTIANA MARIA SOBRAL GRIZ, Vanessa dos Anjos Guedes, Letícia Teixeira Mendes, Luiz Manuel do Eirado Amorim

Last modified: 2015-08-27

Abstract


Introdução

Esse artigo apresenta parte dos resultados de uma pesquisa intitulada Projetos de apartamentos do Recife: caracterização dos modos de morar do século XXI (GRIZ, 2014). Seu objetivo principal é realizar um diagnóstico sobre os projetos de apartamentos produzidos pelo mercado imobiliário do Recife, para poder propor estratégias capazes de guiar a concepção de tais projetos, de maneira que seus atributos construtivos e morfológicos (formais e configuracionais) facilitem, em certa medida, as customizações.

Uma das principais funções da habitação, seja ela casa unifamiliar ou apartamento, é oferecer as condições para que determinada pessoa (ou grupo delas – a família) desempenhe certas atividades domésticas de acordo com seus modos de habitar. Esse último, por sua vez, é alterado conjuntamente com a estrutura de valores de uma determinada sociedade. É compreensível, portanto, que à medida que essa estrutura de valores se altera, mudam-se também os elementos programáticos da habitação. Essa é uma das principais razões para a existência de reformas e adaptações em uma habitação (HANSON, 1998; TRIGUEIRO, 1994). Em algumas cidades brasileiras (GRIZ, 2012, FRANÇA, 2008; PAULA, 2007) é comum adquirir um apartamento - produto caracterizado pela homogeneização de soluções projetuais (TRAMONTANO, 2004; BRANDÃO, 2002) e customiza-lo.

O ponto de partida para esta investigação se deu a partir de uma pesquisa (GRIZ, 2012) que mensurou o quanto projetos de apartamentos propostos pelo mercado imobiliário (os Projetos Originais – POs) eram customizados por seus compradores, resultando nos Projetos Reformados (PRs). Os resultados dessa mensuração mostram que a customização de um determinado projeto depende, em certa medida, das características do projeto original do apartamento.

Sabe-se que muitos fatores podem influenciar na decisão de reformar ou não uma habitação, como a condição financeira, por exemplo. No entanto, essa fase da pesquisa se restringe aos fatores de natureza formal e construtiva do projeto. Nesse sentido, o objetivo é analisar em que medida esses atores influenciam na customização dos PRs. É necessário, portanto, identificar as características da forma e da estrutura dos POs que pode permitir, restringir ou até mesmo impossibilitar as reformas. Tendo esses dados como insumo, é possível propor estratégias que sejam capazes de guiar projetos de apartamentos cujos atributos construtivos e morfológicos, em certa medida, facilitem as reformas dos clientes, aumentem a flexibilidade do projeto e minimizem os custos do processo de customização.

Procedimentos metodológicos

Como o foco da questão é de natureza essencialmente formal, é usada a gramática da forma como um instrumento analítico dos projetos. Criada por Stiny e Gips (1972), a gramática da forma pode ser descrita como um “sistema de algoritmos para criar e entender projetos diretamente através de computação com formas [...] é uma série de regras que são aplicadas passo a passo a formas para gerar uma linguagem de projeto” (ELOY, DUARTE, 2011, p. 51).

As gramáticas da forma são essencialmente generativas, à medida que podem ser usadas para gerar novos projetos dentro de uma mesma linguagem. Entretanto, elas também podem ser descritivas - quando possibilitam maneiras de explicar a estrutura formal dos projetos que elas geram (a descrição é feita através do processo de inferir vocabulário e regras de um corpus pré-definido), ou analíticas - usadas para dizer se um determinado projeto está na mesma linguagem que outro. Além disso, esses três tipos de gramática também pode ser paramétrica, quando usada para codificar ordenadamente uma gama mais ampla de variações formais para a mesma regra. Numa gramática paramétrica, cada regra consiste em uma serie de regras, que podem codificar muitos atributos da forma de maneira que uma maior variedade de formas pode ser combinada (ELOY, DUARTE, 2011).

Tendo esses conceitos como base, a presente investigação vem sendo desenvolvida em duas etapas:

Etapa 01 (já concluída): Criação de uma gramática descritiva e analítica dos POs, que define regras graduadas de acordo com seus potenciais para reforma. O objetivo é descrever, através de regras que formem uma mesma linguagem, as características formais (de adjacência), e construtivas dos projetos originais (POs). (Para a graduação do potencial de reforma são necessários dados vindos da etapa 02);

Etapa 02 (conclusão prevista para julho/2015). Criação de uma gramática descritiva e analítica dos projetos reformados (PRs) – a gramática das reformas (que, neste caso, também precisa ser paramétrica). O objetivo é identificar as regras de reformas mais importantes, referidas como padrões de reforma (a partir dessa identificação será possível graduar as regras da gramática analítica dos POs de acordo com seus potenciais de reforma).

Como um dos requisitos primordiais para se customizar um projeto é o da adjacência entre os ambientes, a gramática dos POs se baseia neste principio e apresenta, também, informações relativas aos aspectos construtivos da edificação. No entanto, o objetivo final, para essa gramática, é que as regras que a compões sejam graduadas de acordo com seu potencial para reformar. Nesse sentido, essas informações adicionais agem como atenuantes desse potencial. Por exemplo, mesmo ainda não tendo sido finalizada a segunda etapa, já se percebe que a adjacência entre a sala de estar e o quarto 1[1] é uma das que apresenta um alto potencial para reformar, ou seja, numa escala de 0 a 5, essa regra é uma das que pode apresentar potencial 5. Entretanto, se em um determinado projeto essa adjacência vier junto com um pilar entre esses ambientes (informação descrita nas condições da regra da gramática), o potencial de reforma pode cair para zero, caso a posição do pilar impossibilite a modificação.

Resultados

A aplicação dos princípios da gramática da forma na análise dos projetos de apartamento explicita certos padrões da sua organização espacial - os padrões de adjacência nos POs e os padrões de reforma nos PRs.

A gramática dos POs descreve a organização formal dos projetos originais dos apartamentos, levando em conta a adjacência entre os ambientes. Nesse tipo de projeto, onde a padronização das soluções é altamente verificada, percebe-se que existe uma linguagem formal onde a adjacência de certos ambientes é aplicada sistematicamente, seja por razões funcionais (e, praticamente, impositivas), seja por razões especulativas (que já antecipam a possibilidade de reformar). Exemplos de adjacência por questões funcionais incluem basicamente ambientes onde existe a acessibilidade direta entre eles, como o dormitório do casal e seu banheiro privativo (que, juntos, formam a suíte principal), a sala de jantar e a de estar, a cozinha e a área de serviço, a sala de estar e a varanda, por exemplo. A adjacência aqui classificada como especulativa é verificada principalmente entre: um dos dormitórios e os ambientes sociais do apartamento, a suíte principal e um dormitório ou suíte secundária, o quarto de serviço e a suíte principal, a cozinha e a sala de jantar (que nem sempre apresentam acessibilidade direta), dentre outros.

Nos PRs, mesmo que seja buscada uma singularidade do ambiente doméstico através das mais variadas soluções projetuais (GRIZ, 2012), percebe-se que esta “variedade” apresenta certa uniformidade, verificada através da aplicação de estratégias compositivas semelhantes. A gramática dos PRs está sendo desenvolvida justamente para explicitar essa uniformidade, mostrada pela aplicação sistemática da certas regras para projetos distintos, mas que alcançam resultados comuns dentre as famílias usuárias desses apartamentos: valorizar os ambientes do setor social assim como a suíte principal (GRIZ, 2012). Um exemplo da valorização dos ambientes do setor social é verificado com a aplicação da regra EsQ da gramática dos PRs (Figura 1), que ao ter a sala de estar adjacente a um dos dormitórios, esse último desaparece e sua área é incorporada pela sala de estar, seja para aumenta-la, seja para inserir atividades especializadas, como a sala de TV. Regra semelhante é utilizada para valorizar a suíte principal. Neste caso - regra QS, a adjacência do quarto é com a suíte, e o primeiro desaparece para que sua área seja incorporada no dormitório do membro da família de maior status.

Apenas por esses dois exemplos é possível perceber que essas duas regras, que formam um forte padrão de reforma, servem como dado que justifica a graduação das regras da gramática dos POs. Nestes dois casos, a regra seria classificada com potencial de reforma 5, isto é, o potencial máximo para reformar, mostrando, assim, a influência que a adjacência de certos ambientes doméstico exerce sobre o potencial de reforma de um projeto de apartamento.

Discussão

Sabendo que a demanda por alterações nos projetos originais de apartamentos ofertados é crescente, acredita-se que o futuro de mercado imobiliário de está na oferta de apartamentos com maiores facilidades para se adequarem aos requerimentos específicos das famílias contemporâneas. Isso exige, por parte das empresas, a adoção de soluções que procurem compatibilizar produção eficiente e satisfação dos compradores. O que se espera é que a partir dos dados resultantes dessas duas gramáticas – a dos POs e a dos PRs, a investigação se desenvolva no sentido de criar uma gramática generativa de POs com alto potencial para reformar. Assim, será possível identificar e desenvolver os princípios que guiam projetos de apartamentos que possam ser adaptáveis mais facilmente, minimizando, assim, os inevitáveis custos de reforma.

 

 


[1] O dormitório mais próximo do setor social.

 


Keywords


Projetos de apartamentos, gramática da forma,

References


BRANDÃO, D. Diversidade e potencial de flexibilidade de arranjos espaciais de apartamentos: Uma análise do produto imobiliário no Brasil. 2002. 429 f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002.

ELOY, S.; DUARTE, J. P. A transformation Grammar for Housing Rehabilitation. Nexus Network Journal, Porto, v. 13, n.1, 2011.

FRANÇA, F. C. Indisciplina que muda a arquitetura: a dinâmica do espaço doméstico no Distrito Federal. 2008. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade de Brasília, Brasília, 2008.

GRIZ, C. Quando o luxo é necessário. Sobre projetos de apartamentos no Recife. 2012. 369 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Urbano) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2012.

GRIZ, C. Projetos de apartamentos do Recife: relação entre morfologia e modos de morar contemporâneos. 2014. Projeto de pesquisa - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2014.

HANSON, J. Decoding homes and houses. Cambridge: Cambridge University Press, 1998. 318p p.

PAULA, V. D. C. Espaço e sociedade: Apartamentos no Rio de Janeiro no século XX. 2007. 419 f. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007.

TRAMONTANO, M. Apartamentos e vida privada na cidade de São Paulo. 2004. Tese (Livre Docência) - Universidade de São Paulo, São Carlos, 2004.

TRIGUEIRO, E. Change in domestic space design. 1994. Tese (PhD em Advanced Studies) - University College of London, Londres, 1994.

STINY, G.; GIPS, J. Shape grammars and the generative specification of painting and sculpture In: IFIP CONGRESS, 7., 1972, Amsterdam. Proceedings.... : C. V. Freimanp. 1460-1465. Disponível em: <http://www.shapegrammar.org/ifip/ifip1.html>. Acesso em: 05 nov. 2014.


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