Last modified: 2015-08-27
Abstract
Introdução:
O Centro Universitário Belas Artes de São Paulo inaugurou em Fevereiro de 2015 seu primeiro Laboratório de Fabricação Digital e Prototipagem Rápida, e uma série de questões vieram à tona imediatamente. Talvez, dentre as inúmeras perguntas, a mais importante seja: de que maneira iniciar um trabalho de difusão das possibilidades dos processos digitais de trabalho, dentro da própria escola, uma vez que o corpo docente, e consequentemente discente, ainda são adeptos dos meios analógicos de projetar. Desta forma, a referida instituição, tem incentivado a organização de palestras com nomes importantes ligados ao Design Digital, workshops e entre outras ações, ressaltamos aqui o estabelecimento de uma atividade extracurricular, posicionada como Extensão Universitária, intitulada “Processos Projetuais Emergentes: Design e Fabricação Digital para a construção de um abrigo responsivo”.
De acordo com o que Rivka Oxman cita em seu artigo “Theory and design in the first digital age”, de 2006, que além de ressaltar modelos paradigmáticos de processos digitais de trabalho, o qual o grupo dedica-se a desenvolver seguindo o modelo de generative models e performance models, tomou-se também o objetivo principal desta atividade de extensão, que é criar um ambiente de reflexão na prática, onde as ferramentas digitais de design e fabricação e as relações que se criam entre o designer ou arquiteto, e seu produto final, assumam caráter de análise e comparação com os processos tradicionais utilizados tanto, no curso de Arquitetura e Urbanismo, como Design Industrial. Os produtos desta atividade servirão de base para divulgação das potencialidades dos processos digitais de trabalho, dentro da própria escola, e com o envolvimento de professores e alunos, contribuir para a criação de bases para a futura e gradual modificação da base curricular dos programas dos cursos mencionados, adequando-os a tais realidades contemporâneas.
Procedimentos metodológicos:
A partir de uma bibliografia básica, que inclui textos de Mitchel, Kolarevic, Oxman, Picon, e rodadas de discussão envolvendo alunos, professores da própria escola e também convidados com aderência ao assunto, os alunos foram apresentados à questão do processo digital de trabalho. Esta etapa teve o intuito de iniciar um processo de reflexão sobre o tema, e teve inicio um semestre antes da inauguração do Laboratório de Fabricação Digital da escola. Em paralelo, os alunos possuíam aulas extras, utilizando uma base virtual e encontros presenciais, envolvendo a utilização dos softwares Ecotect, Rhinoceros, e seu modelador paramétrico Grasshopper com os plug ins Kangaroo, Weaverbird, Geco, Howl, Cliper e Karamba.
Na ocasião da inauguração do Laboratório, foi firmada uma parceria com a empresa Masisa, que forneceu chapas e os ensaios do recém-lançado mdf resistente à água, e a proposta de um projeto para um abrigo responsivo, a ser montado em área de propriedade da escola, foi lançada. Após a coleta dos dados iniciais, os alunos que participaram das etapas anteriores, orientados pelos professores responsáveis, iniciaram um processo de trabalho 100% digital, utilizando as ferramentas e bases conceituais que tomaram conhecimento no semestre anterior, e criaram uma série de algoritmos possíveis a solução do problema.
Devido à natureza do material, e os dados técnicos obtidos com os ensaios laboratoriais fornecidos pela empresa, uma das premissas do projeto era a adoção de uma geometria que fosse capaz de absorver e distribuir bem esforços de compressão, e minimizar esforços de tração, sem necessariamente adotar formas ortogonais, que dificultariam a relação do volume a ser edificados, em harmonia com as forças do lugar, como insolação, sombreamento, ventos e demais parâmetros, uma vez que os algoritmos desenvolvidos sugeriam uma melhor adaptação de um objeto que possuísse formas orgânicas. Uma pesquisa adicional, na obra do engenheiro Eladio Dieste e do arquiteto Antony Gaudi, sugeriram a utilização de geometrias que se baseassem em catenárias, devido suas possibilidades de aplicação estrutural condizente com as necessidades impostas pelo material disponível.
Com o apoio dos equipamentos do laboratório, que possui técnicas de fabricação digital por adição (impressoras 3d que utilizam PLA ou ABS) e técnicas de subtração (máquina de corte a laser e router CNC) os alunos tiveram a possibilidade de criar modelos físicos, tanto em escala reduzida como em escala um para um, sempre que algum algoritmo criado gerasse algum resultado razoável, o que ampliou as possibilidades de interação com os objetos criados virtualmente, contribuindo sensivelmente com a agilidade nas tomadas de decisão, devido a alta fidelidade e precisão que tais técnicas oferecem.
Resultados:
Em linhas gerais, podemos destacar diversas observações, que na etapa do desenvolvimento desta pesquisa, aparecem aqui como conclusivas. A ideia de desenhar sobre o material, que indiretamente sugere o processo de projeto adotado, levou o grupo a modificações na condução de decisões em tempo real, em função de sistemas de encaixe entre peças e problemas construtivos diversos, que em processos analógicos de trabalho apresentam-se como implícitos, mas dentro de um fluxo digital de projeto e fabricação, utilizando modelagem paramétrica e prototipagem rápida, aparecem como explícitos, e demandam imediata solução. Embora a atividade ainda esteja em andamento, como mencionado, pode-se notar que a aplicação do pensamento digital, sobre o projeto, dinamiza a relação entre o arquiteto ou designer e seu objeto, agilizando e aprimorando sensivelmente os caminhos a serem tomados durante o processo projetual, entregando altíssima qualidade.
Do ponto de vista acadêmico, a experiência tem mostrado que há um custo inicial para compreender e aplicar as novas formas digitais de projetar, devido à parca bibliografia em língua portuguesa, poucos interlocutores nacionais, as diversas críticas de colegas contrários às novas técnicas, que culminam em uma rarefeita massa crítica, que de suporte e agilize a troca de informações necessárias, à condução de experiências desta natureza, mas mesmo assim, a conta parcial desta questão tem provado ser favorável aos meios digitais aplicados em arquitetura e design, de acordo com o grupo. Esta atividade de extensão tem gerado, embora de forma lenta, a sensibilização da comunidade do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo ao assunto digital, e este resultado é muito animador: A fabricação de protótipos em escala natural permite a todos da escola visualizarem as experiências do grupo, atraindo novos alunos e professores de todas as áreas de conhecimento da instituição.
Sob o âmbito técnico, especificamente do ponto de vista da fabricação digital e uso de softwares, observamos que o trabalho só pode ser realizado, com o conhecimento disponível pelo grupo, devido à utilização do plug in Kangaroo combinado ao Weaverbird. As formas geradas em diversos algoritmos criados pelos alunos resultavam em superfícies com dupla curvatura, que seriam posteriormente entendidas como partes a serem usinadas pelo router, uma vez que a escola disponibilizou o software V Carve, responsável pela criação de Gcodes para controle dos movimentos de nossa router CNC. Com a combinação destas ferramentas, o grupo criou geometrias que puderam ser divididas em seguimentos planos, e assim adequando o projeto a suas variáveis imediatas, que é a utilização de placas de mdf em sistemas de fabricação digital com router.
Discussão:
O trabalho, desenvolvido pelo grupo desta pesquisa, permite uma discussão sob dois aspectos básicos: a divulgação dos processos digitais de trabalho em ambiente acadêmico, a partir de uma experiência de construção real, que por sua vez, pode desencadear uma discussão da aplicação de tais técnicas na rotina de escritórios de arquitetura e design, que não pertençam a nenhum “star system” da arquitetura ou design mundial. Muitas vezes alguns arquitetos, mesmo professores de arquitetura, costumam enxergar os processos digitais de trabalho, como utilizáveis apenas por uma parcela muito pequena dos profissionais destes campos de conhecimento, no mundo. Desta forma, este trabalho contribui para desmistificar a utilização de tais técnicas, pois com equipamento disponível a custos não muito elevados, e operados por alunos, podem gerar resultados acessíveis.
Ainda deve ser levada em conta, e discutida por arquitetos adeptos ao processo digital, tanto projetual, como no tocante a construção civil, o fato de este trabalho experimentar um novo material, que se adequa as realidades da fabricação digital, por ser facilmente usinável, possui qualidades estruturais já ensaiadas, e resistência garantida pelo fabricante contra intempéries. Branko Kolarevic aborda a questão de novos materiais e novas técnicas de fabricação, e embalados em suas linhas de raciocínio, poderíamos levantar algumas discussões. A técnica de fabricação digital empregando router CNC é de baixo custo, comparada a outras técnicas disponíveis no mercado, e poderia ser uma solução viável para ser apresentada como alternativa a ser utilizada como sistema estrutural e de vedação. Será que com o uso de uma técnica com custo mais acessível, poderiam ser resolvidos gargalos para a compreensão e adoção de processos projetuais e de fabricação digitais em arquitetura?
Keywords
References
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