XIX Congress of the Iberoamerican Society of Digital Graphics, 

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A ABORDAGEM CIENTÍFICA AO PROJECTO NO INÍCIO DA ERA COMPUTACIONAL - HOCHSCHULE FÜR GESTALTUNG OF ULM E A SUA DIÁSPORA
isabel clara neves

Last modified: 2015-08-27

Abstract


1. ABSTRACT

Após a Segunda Guerra Mundial, assiste-se ao início do desenvolvimento da computação moderna (digital). Apesar do computador neste período ser uma máquina apenas acessível a alguns matemáticos e programadores, ele não deixa de ser objecto de teorização e influência mais vasta. O cálculo e lógica matemática inerentes ao computador suportam a emergência de áreas como a teoria da informação e a investigação operacional, que despertaram o interesse também nas ciências sociais ou nas artes.

O projecto arquitectónico foi influenciado por aplicações científicas que permitiram lidar com uma grande quantidade de informação na solução de problemas complexos, através da análise matemática, e do suporte do projecto na lógica, o que modificou a concepção, representação e produção da arquitectura.

Nas décadas de 50/60, grupos de investigação em universidades ou mesmo movimentos ligados ao design e à arquitectura, tanto no Reino Unido como nos Estados Unidos da América, tais como o Land Use and Built Form Studies Center (LUBFS) em Cambridge,  o Design Methods Movement no Royal College of Art em Londres, o Architecture Group Machine no MIT, ou o Design Methods Group  (DMG) no College of Environmental Design, Berkeley, Califórnia, começam a integrar-se as metodologias de desenho baseadas na análise e lógica matemática e sua aplicação no processo de concepção de projecto. Esta motivação também está presente na Hochschule für Gestaltung Ulm, na Alemanha, fundada em 1953 pelo arquitecto suíço Max Bill. Apesar da breve existência desta Escola (53-68), foi considerada como a Escola mais importante do século XX depois da Bauhaus, em que convergiram um conjunto de docentes, ideias e trabalhos notáveis deste período.

Neste âmbito temático, reconhecendo a existência de investigação já realizada sobre outras instituições relevantes e, simultaneamente, detectando a escassa existência bibliográfica sobre a HfG-Ulm, o estudo desta escola germânica e a sua diáspora e influência noutros centros de investigação, emerge como uma oportunidade de investigação pertinente e necessária. A presente dissertação propõe-se estudar a relevância da HfG-Ulm no contexto da investigação de métodos científicos associados ao projecto, que vieram a ser determinantes no surgimento de um pensamento computacional na arquitetura.

À semelhança do que aconteceu após o encerramento da Escola da Bauhaus, logo que a HfG-Ulm fechou, parte dos seus mestres e estudantes saíram do país, deslocando-se para outras Universidades de Design e outros centros de investigação, levando até essas instituições, os preceitos desenvolvidos na HfG-Ulm. Não houve propriamente uma diáspora, como aconteceu na Escola da Bauhaus, mas houve efectivamente uma expansão de ideias e influências veiculadas pelos protagonistas que se deslocaram para outros países, influenciando outras Escolas e instituições.

O que neste artigo designamos de “Post Ulm”, encerra o espectro de relações que se alargaram para além da existência física da Escola e seus intervenientes presentes, até um leque de interferências mais vasto e diversificado. Reflectir-se-á acerca das ideias que se desenvolveram a partir da HfG-Ulm, através dos intercâmbios de alunos e professores estrangeiros, pois interessou-nos perceber de que forma as suas ideias foram expandidas, desenvolvidas e apreendidas, gerando outputs distintos, num período significativo que decorreu até aos anos 70 e que marcou a introdução de diferentes concepções computacionais na arquitectura, viabilizando a interacção de computadores na prática arquitectónica.

Na HfG-Ulm deu-se enfoque à recepção de conceitos e disciplinas como a Teoria da Informação e a Cibernética, e a forma como estas áreas foram livremente reinterpretadas na direcção de uma nova pedagogia de ensino de Tomás Maldonado, da filosofia estética de Max Bense e de uma nova metodologia científica veiculada através de Horst Rittel, resultando numa síntese que constitui a essência de uma nova abordagem de projecto na HfG-Ulm.

 

Cartografar-se-à a evolução da Hochschule fur Gestaltung de Ulm, seus investigadores e ideias distintivas, pelo modo como definem uma nova abordagem ao projecto, marcadamente influenciada por métodos científicos, historiografando a sua existência e seu contributo pouco estudado, no surgimento de um pensamento computacional na arquitetura, ainda sem a utilização na prática de computadores, assim como se tentou perceber qual a influência das disciplinas emergentes da teoria da informação, pesquisa operacional e metodologias científicas sobre o discurso e pensamento arquitectónico, da criação, geração e produção do projecto de arquitectura nas décadas de 50 a 70.

 

O trabalho centrou-se na evolução da Hochschule für Gestaltung de Ulm, seus docentes e respectivas ideias centrais, mas também se aferiram hipóteses de continuidade desta Escola nos Estados Unidos, seleccionando-se o percurso de Horst Rittel e suas ideias desenvolvidas na Universidade de Berkeley.  Averigua-se a convivência, confrontação, complementaridade entre a sua visão científica de projecto e a de Christopher Alexander, também presente em Berkeley, a partir de 1963. Cada um destes dois mentores veicula concepções computacionais específicas, sendo que o cruzamento destas duas análises permite perceber o papel pioneiro e influenciador da Escola de Ulm como um gerador de ideias ligadas à relação da ciência com o desenho, contrapondo-o, ainda que indirectamente, ao contexto de Cambridge de onde Alexander era proveniente. Esta  investigação terá como metodologia base a visita a arquivos selecionados de máxima relevância para este estudo. A análise do material da biblioteca da Escola, que foi congelado em 1968, foi armazenado no Arquivo e museu da Hochschule fur Gestaltung HfG (1953-68), esta formação contemplará a pesquisa no Arquivo College of Environmental Design, Berkeley, e em Milão os arquivos pessoais de Tomás Maldonado.

 

Argumenta-se que, apesar de ter subsistido durante 15 anos, a sua influência fez-se sentir em correntes e objectos artísticos, conceitos e programas curriculares, de Escolas de diferentes locais. A HfG-Ulm teve assim um papel importante na divulgação de alguns conceitos científicos úteis para a construção do pensamento computacional e da produção criativa, que se expandiram pela Europa e Estados Unidos.

Argumenta-se que nesta escola, através do trabalho desenvolvido por alguns docentes e sua aplicação, se formulou uma mudança na compreensão do sujeito e do objecto, que levou posteriormente a uma reformulação radical da produção de forma. A forma foi repensada sintaticamente a um nível de notação, a partir de um nível de código, não como uma forma semântica. Somente há relações e formas, e não significado, conduzindo a uma forma estética totalmente sintática e anti-semântico.

Todo o trabalho desenvolvido nesta escola e analisado nesta investigação, baseado nos princípios da filosofia da ciência, da teoria dos sistemas, da pesquisa operacional e da lógica matemática foi movido por um interesse que defendemos como estético. Não um interesse na aparência do objecto, mas uma crença numa estrutura subjacente que a matemática ou a lógica tenta capturar. Idealmente nesta estética não há figuras arquitetônicas, objetos, significados, somente relações e formas, formando-se fundamentos que estão na base das posteriores abordagens computacionais na arquitectura que utiliza a computação não como uma ferramenta de desenho geométrico, mas sim como uma ferramenta de desenho computacional.

Argumenta-se também que a metodologia desenvolvida na HfG-Ulm apresentava fortes paralelismos e similaridade de intenções com a metodologia de processo de design paramétrico/algorítmico. A metodologia da HfG-Ulm apresentou alguns aspectos fundamentais que nos permitiram fazer esta analogia. A noção de domínio da forma através da interrelação geométrica, tornando possível explorar variações do projecto e outras soluções espaciais; a decomposição do objecto em partes ou componentes que podiam ser descritas através das regras; e finalmente a intenção de explorar novas formas baseadas na lógica. O arquitecto partia das regras que regiam as formas, em detrimento das formas estabelecidas, dominando as regras do sistema, mas não as formas geradas. Na HfG-Ulm empregaram-se algoritmos para gerar o projecto de arquitectura/design, o que significou identificar claramente o problema, descodificando-o e adaptando-o. Abordou-se a questão de “desenhar as questões de projecto”, as “regras geradoras da forma”, em vez de desenhar a forma propriamente, assimilando e debatendo o emprego de algoritmos. Os processos algorítmicos utilizados na HfG-Ulm estavam relacionados com procedimentos lógico-matemáticos utilizados no processo de projecto, e não com o uso da máquina propriamente dito.

Mesmo que a Escola tenha tido uma orientação teórica e metodológica única, o foco numa teoria abrangente era algo compartilhado com outras instituições nesse momento, o que se torna evidente quando a HfG é comparada ao movimento dos métodos de design em Inglaterra e nos EUA. Esta comparação faz sentido, tendo em conta a documentação de intercâmbio entre os estudiosos na HfG, na Grã-Bretanha e nos EUA. Mas talvez ainda mais revelador do papel que a HfG-Ulm teve nos discursos de arquitectura e design das décadas de 50 e 60, terão sido as múltiplas trocas recíprocas, directas ou indirectas, que ocorreram entre os membros da Escola e artistas internacionais, arquitectos e críticos de arquitectura.

Concluiu-se que na HfG-Ulm buscaram-se precisamente lógicas internas à própria computação como fonte primordial para a criação de novos conceitos, explorando-se um domínio mais próximo do designado design thinking, do que propriamente o das técnicas de design computacional, daí a radicalidade e inovação que atribuímos à pedagogia Ulminiana, protagonizada pelos docentes mencionados. Da análise do Post HfG-Ulm: diásporas e Maturações, pôde concluir-se também que a abordagem científica ao design no College of Environmental Design, na Universidade de Berkeley, efectivou uma continuidade ideológica Ulminiana, argumentando-se que a radicalidade das propostas aí desenvolvidas tiveram a sua génese na HfG-Ulm.

Deste modo, depois de quase 50 anos de assimilação tecnológica no âmbito da arquitectura, contribui-se para o enriquecimento da História e Teoria da arquitectura computacional, que ainda apresenta áreas que necessitam de ser investigadas para a construção e ampliação da discussão teórico-histórica de uma perspectiva computacional na arquitectura.


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